5 de dezembro de 2012

deslumbre


Quando já tava nessa cidade há uns seis meses pensei que quando completasse um ano da minha chegada aqui escreveria uma carta endereçada a mim contando como foi. E uma aos amigos que fiz aqui, agradecendo e convidando pra mais alguns desses de histórias pra contar. Aos dez anos aqui ou em qualquer outra cidade que me acolhesse eu leria a carta e lembraria como foi aquele primeiro ano em Porto Alegre. Turbulento. Incansável. De muitas noites sem dormir. Ainda não é dia o dia escolhido pra escrever a carta, mas é final de ano e, se a publicidade agir em mim como deveria, é época de emoções à flor da pele. Por sinal, a frase à flor da pele me lembra que quando era criança ganhei uma “agenda da tribo” em que dezembro vinha com a música do Zeca Baleiro. “Ando tão à flor da pele que qualquer beijo de novela me faz chorar”. Feliz, ando à flor da pele feliz. Dezembro é meio beijo de novela. Meio propaganda do Zaffari. Onze meses de Porto Alegre.

Eu sempre soube que iria morar aqui. Nunca soube como seria. Perdi muito ao vir e ganhei muito chegando. Uma balança que nunca despencou muito pra um lado ou pra outro. Deixei uma vida de dois, virei um, aprendi em alguns momentos a ser dois de novo, desaprendi. (No livro que eu ando lendo “O que é o Amor” a autora diz que os amantes são sempre ignorantes). Aprendi aqui, sentada vez ou outra no Cantante, a costurar o meu coração só pra poder rasgar de novo. Porque viver é andar por aí rasgando o coração. Ninguém deixa de fazê-lo porque aprendeu a ser mais forte ou mais sábio. E, também não quero, nunca, esse tipo de sabedoria. Aprendi, tomando um “Carioquinha”, a administrar a balança (infelizmente não a do meu peso). Felicidade, dinheiro, gastrite, amor. E, por aí vai.

Dei jeito no que tinha que dar. Troquei lâmpadas. Gritei de câimbra na panturrilha (herança genética que me atordoa e que me traz sentimento de casa) sem meu pai por perto pra trazer Gelol na madrugada. Fui, na maioria do tempo, radiante. Emocionada. Deslumbrada. E o Aurélio diria “que se entusiasma facilmente por algo”. O melhor sentido da palavra deslumbrada. Uma ótima palavra que perdeu o valor nas bocas por aí. Uma ótima definição pra esse tempo aqui.

É terça. E adoro terças. Me vi de frente. Sem fantasia. Me olhando no espelho e pensando: eu passei por isso. Eu consegui me virar. Onze meses conseguindo me virar. Sem deixar nenhum aluguelzinho sem pagar, passando uma semana com apenas alguns trocados na carteira, descobrindo novos lugares que são meus, comprando uma pilha de livros que não tenho tempo pra ler, cultivando amigos e fazendo jantares pra comemorar que eles existem e que sempre se arranja tempo pra eles.
Eu que sempre fui meio descrente de mim consegui onze meses. Sem contar. Acordando e perguntando: hoje é dezembro? Hoje é. Que tempão que passou. E, como passou rápido. E, ainda tem um mês pro dia da derradeira comemoração que certamente vai passar voando e vamos todos gargalhar lembrando daqui a muito tempo. “Vamos celebrar nossa própria maneira de ser”. Desorganizada, quase sempre meio de chegada, quase sempre meio feliz até triste, deslumbrada.

Feliz onze meses, Porto Alegre.