26 de novembro de 2009

Insatisfação Crônica

Hoje vi “Vick Cristina Barcelona”, atrasada, depois de todo mundo se esgotar de comentar. Era o tipo de filme que sempre deixava como a terceira opção na locadora, tenho um certo preconceito com Scarlett Johansson. No entanto, que bela surpresa nessa mera quarta-feira candente. Além do show dado por Penélope Cruz, ouvi da sua boca a melhor denominação da história do cinema: Insatisfação Crônica. A doença de procurar em todos os cantos do mundo algo que sacie uma certa vontade confusa, uma vontade que mal se sustenta, e de tanto querer ser, se confunde no que não é. Quem sofre deste mal pouco é entendido, não sabe esclarecer o que acontece. São coisas que simplesmente calham, despedidas, recomeços, pequenos ou grandes passos no amor. Complicado, porém crônico, e só de saber que podemos dar um nome para isso já confere uma certa leveza aos ombros.

23 de novembro de 2009

salvadora

O romance está

para mim

como o ovo

está para Salvador Dali

E daqui

estou eu

disfarçada de cisne

meu mundo é um moinho

Nessa madrugada desanimada, ultrapassa pela janela aquele calor das noites que o verão vem trazendo. Nessa madrugada desanimada, estou cá eu e Cartola, triturando sonhos mesquinhos que um dia ei de ter. E vamos nós nessa malemolência das noites que o verão nos impõe, sem esperar nada, armados para algo que ainda não sabemos o que é. Mas, ainda é cedo.

Ainda é cedo amor
Mal começaste a conhecer a vida
Já anuncias a hora da partida
Sem saber mesmo o rumo que irás tomar

Preste atenção querida
Embora saiba que estás resolvida
Em cada esquina cai um pouco a tua vida
Em pouco tempo não serás mais o que és

Ouça-me bem amor
Preste atenção, o mundo é um moinho
Vai triturar teus sonhos tão mesquinhos
Vai reduzir as ilusões à pó.

Preste atenção querida
De cada amor tu herdarás só o cinismo
Quando notares estás a beira do abismo
Abismo que cavaste com teus pés

9 de novembro de 2009

Sobre o dia em que menti

Aquele dia, eu menti. Não queria admitir, mas menti. Menti pelas diversas razões que levam alguém a mudar os fatos. Fúria, raiva, desprezo, tristeza, medo. Menti porque a verdade me pareceu destoar do momento. Porque de alguma forma minha “nova verdade” me faria mais forte.

Talvez, isso pertença mais ao mundo feminino, os homens simplesmente discutem com argumentos baixos e palavrões bruscos. Nós, mulheres, queremos ir mais longe, queremos dividir a ferida.

As folhas do calendário foram se esvaindo (se colorindo de reuniões e indo com as noites), eu engoli aquela falsidade, e agora, abandono em palavras o que antes tanto me incomodou.

Todos deixam um pouquinho de si quando vão embora, menti. Aos trancos e barrancos (entre gritos e xingamentos) alguém me disse: “Não te preocupa tanto!” (claro, multiplicando a hostilidade dessas palavras). E eu, que pensava não dar valor para estes vocábulos, me encontrei hoje, aqui, com um quê de ser/estar pelo que se é. Leve de vontades.

Dei por mim que todo homem terá defeitos, alguns farão barulho ao comer, alguns não terão lido aquele livro, alguns não conhecerão tal música, alguns terão ciúme, alguns serão caseiros demais, outros serão da noite, todos terão deformidades que os farão mais verdadeiros de essência, menos chatos. Dei por mim que os príncipes não existem, nem cavalos brancos, e que todos que parecem ser assim, caem e se perdem de suas majestosas fantasias.

Posso dizer que menti, pois ficou em mim um apreço infinito pela vida real, pela realidade dos tons dos domingos chuvosos (porque nem todo dia será de sol a pino), e nem tudo estará perfeitamente colocado em seu lugar, nem todos falarão as frases que sonhei, nem todos os trabalhos chegarão nas datas corretas e nem todas as amigas serão do modo como descrevi.

E mesmo que tamanho pessimismo não combine comigo, aprendi a colorir a realidade, ver beleza no perder a hora, admirar uma sexta sem programação, e claro, não esperar que as pessoas façam tudo certo, esperar que elas simplesmente façam, ou não.

Eu menti ao dizer a alguém que havia partido sem deixar rastros. Deixou, sim, uma grande e bonita vontade de ser “simples e suave coisa”.


Ouvindo: Orquestra Imperial (Um dos poucos cd's que escuto de cabo a rabo, e é mais um da série: “Achados e perdidos nas gavetas virtuais!”)

6 de novembro de 2009

Sobre anteontem

Aqui cai uma tempestade de dar medo. No lugar onde todos descansam, nós ficamos a olhar para alguém que já se foi. Temos em nossas mãos aquele corpo cansado, já derrotado, antes contador de histórias. Acabou a fadiga, acabou a medicação, acabou a luta. A vida se desfacela diante de nós. Nós, que antes tão frágeis, tão cuidados por ela, hoje somos platéia desse espetáculo dramático, nossa atriz principal abandonou o palco.
Esta chuva veio lhe levar para longe Vózinha, longe dos choros contidos, das explicações vagas, da maldade de sofrer durante tanto tempo. Estarás naquela motoca, rumo ao horizonte, avante e sempre, bem-aventurada de essência - qualidade dos bons.
Um beijo, Pequena

3 de novembro de 2009

Vai levando


"Mesmo com toda a fama, com toda a brahma
Com toda a cama, com toda a lama
A gente vai levando, a gente vai levando, a gente vai levando
A gente vai levando essa chama
Mesmo com todo o emblema, todo o problema
Todo o sistema, todo Ipanema
A gente vai levando, a gente vai levando, a gente vai levando
A gente vai levando essa gema
Mesmo com o nada feito, com a sala escura
Com um nó no peito, com a cara dura
Não tem mais jeito, a gente não tem cura
Mesmo com o todavia, com todo dia
Com todo ia, todo não ia
A gente vai levando, a gente vai levando, a gente vai levando
A gente vai levando essa guia
Mesmo com todo rock, com todo pop
Com todo estoque, com todo Ibope
A gente vai levando, a gente vai levando, a gente vai levando
A gente vai levando esse toque
Mesmo com toda sanha, toda façanha
Toda picanha, toda campanha
A gente vai levando, a gente vai levando, a gente vai levando
A gente vai levando essa manha
Mesmo com toda estima, com toda esgrima
Com todo clima, com tudo em cima
A gente vai levando, a gente vai levando, a gente vai levando
A gente vai levando essa rima
Mesmo com toda cédula, com toda célula
Com toda súmula, com toda sílaba
A gente vai levando, a gente vai tocando, a gente vai tomando, a gente vai dourando essa pílula"