16 de outubro de 2012

a descomplicada do Bonfa

Eu gosto da Duda porque a Duda simplifica. A Duda é minha vizinha de porta. A gente mora porta-com-porta. Quando me mudei pro prédio demorei a ver que a Duda morava no apartamento da frente. Um dia cheguei do trabalho e peguei no sono, acordei assustada, atrasada pra um show e sem um puto pra pegar um táxi. Vesti o primeiro vestido que encontrei e bati na porta da Duda pedindo dinheiro emprestado. O que me faltou de vergonha na cara sobrou na Duda de boa vontade. Desde lá era isso, abridor de vinho pra cá, bilhete agradecendo um favor pra lá e de vizinha a Duda passou a ser a Duda que simplifica tudo. Quando a Duda sente vontade de alguma coisa, ela fala, simplifica. Discursa alto, reclama, anda pra lá e pra cá segurando um cigarro, "hoje preciso de um cigarro, só hoje", conta dos casos capengas de amor e faz piada, ri da maioria deles. Quando a Duda quer alguma coisa, segura a Duda. Mas, ela simplifica. Ela não complica. Subindo as escadas teoriza: sim, é lucro, não, continuo na mesma e a minha mesma é boa. A Duda não complica. A Duda me descomplica. E, desde que a Duda virou a Duda que me descomplica, toda vez que vou complicar a Duda abre a porta e diz: só vê se não complica. E, até tento orgulhar a Duda porque ela fala alto e com muita ênfase. Descrente, a Duda que me descomplica as vezes perde as esperanças em mim: tu vai complicar né? Vira, resmunga e bate a porta: vou até fumar um cigarro. Eu gosto da Duda porque a Duda simplifica, mesmo que não consiga.