28 de outubro de 2009

amor, amour, love, liebe, karl


Comecei a semana em prol do amor. Talvez o universo esteja conspirando para que eu escreva sobre ele – amor, amour, love, liebe, karl -. Ele se esconde onde ninguém percebe, em bilhetes, em um gesto de atenção, em um desenho na mão. A paciência que se esvai entre os casais envelhecidos está exatamente nesse erro: Deixar o amor se esvair dos pequenos lances. Ninguém necessita de televisão aberta e faixa no avião, ela não precisa de flores quando é alguma data especial, talvez ele só precise que ela não esqueça de trazer uma novidade (quiçá um novo tempero) na janta de (mera) terça-feira.
É por isso que venho aqui falar do amor que é simples de nascimento, do olhar, do movimento que ela faz com o cabelo, da forma como ele caminha. O amor está no silêncio que fica entre as velhas músicas (notadamente escolhidas) que tocam, está na gargalhada que ela dá na mesa do boteco, está no modo como ele repara que é o responsável. O amor está em não esquecer, por um segundo, que se é amor.


“Não se afobe, não
Que nada é pra já
O amor não tem pressa
Ele pode esperar em silêncio
Num
fundo de armário
Na posta-restante
Milênios, milênios
No ar”


26 de outubro de 2009

Um brinde

Se existem dois seres humanos que eu não me canso de ouvir falar, são Chico e meu pai. Poderia ouvi-los por horas a fio. Sou uma eterna admiradora de escutar suas histórias (mesmo que por vezes elas se repitam), malemolências de uma vida repleta de percalços, viagens, passagens de rodoviária. Homens que levam consigo “olhinhos infantis”, a sabedoria de viver com um sorriso no rosto, com um sorriso nos olhos. Homens que possuem sempre um quê de anedota em suas frases. Talvez seja por isso que é tão bom escuta-los. Homens que têm luz própria, malandros de essência, eternamente apaixonados. Homens que têm a lei de serem “obrigatoriamente felizes”. Homens que nasceram muito antes do “tempo da maldade”.
Meus eternos ídolos, um lá e o outro aqui, que sabem sempre fazer os meus dias um tanto quanto mais bossa, e minha vida um tanto quanto mais nova. À vocês, um brinde.

É bão?


Quem me dera ter, vida com trilha sonora, cabelo que não fica feio em dia de umidade, genética de atleta, mente de filósofo. Quem me dera ter, marido com cara de revolucionário, dom para tocar um instrumento musical, dinheiro para passar uns tempos em Cuba. Quem me dera ter, um fusca 71, câmera 16 mm, juros 0. Quem me dera ter, quem me dará? O mundo as vezes é injusto, Sebastião.

Ao som de: Buena Vista Social Club (Tinha esquecido, por algum tempo, este cd jogado as traças das gavetas virtuais.)

"Mas eu sou menina"

Faça as contas. Duas amigas, quatro comédias românticas, um pacote de pipoca, uma pitada de sal, alguns edredons grandes e quentinhos, dois pares de pantufas. Acrescente amores mal resolvidos, unha quebrada, preocupação com a prova passada, estafa, gargalhada e café batido. A fórmula seria brevemente resolvida com uma caixa de lencinhos de papel. Estar rodeada de mensagens românticas é diretamente proporcional aos suspiros e almejos de momentos maiores de tudo, homens maiores em tudo. No entanto, no mundo feminino, nada pode ser tão simples. E é por isso que nós resolvemos com dias como estes. As vezes é tão bom ser mulherzinha.

"Chegando as 6, tá bom demais"

O cheirinho de verão começa a tomar as ruas da velha cidade. Enquanto ela observava o cuidadoso passo dos vagantes através do parapeito da sacada, tentava entender o porquê daquilo tudo. Está chegando a estação mais quente do ano. As meninas começam a mostrar os ombros. Os homens começam a planejar as fugas dos relacionamentos. Há um frenesi envolvendo os amantes. E os andantes, vistos através do olhar atormentado daquela sacada, têm um quê de ansiedade. Está chegando a estação mais quente do ano, e ela, sinceramente, não está com a mínima paciência.

25 de outubro de 2009

Eis que quero


Eis que quero um domingo assim: Filme de Almodóvar. Pincel cheio de cor. Quarto cheio de bagunça. Eis que quero um domingo assim. Braço estreito do abraço forte. Braço forte do abraço extenso. Que demore e se prolongue até a hora de levantar do tédio. Bendito tédio. Eis que quero um domingo assim. Acordar e morrer de ser domingo.

19 de outubro de 2009

Ser como

"Uma liberdade de pensar num espaço maior, de não ter tantos limites, de flutuar em nuvens de imagens e pensamentos simples e belos. Essa é minha idéia, não que seja assim. Não sei como é. Sei que queria ganhar dinheiro só pra fazer coisas bonitas."

Erica Gonsales

E a vida não



"Um lugar deve existir, uma espécie de bazar, onde os sonhos extraviados vão parar. Há de haver algum lugar, um confuso casarão, onde os sonhos serão reais, e a vida não."

Chico

15 de outubro de 2009

Pra você eu digo sim

É quando todo o corpo se preocupa em enviar aquela mensagem, como uma certa missão, a batalha é intenção. Tudo começa com os olhos, são os gerenciadores, aqueles soldados que ficam observando atentamente cada movimento do batalhão inimigo. Então, começam a especulação. Cada gesto é altamente verificado e seu relatório enviado ao cérebro. Esse tem o papel de pai ciumento. Caso goste ou não, manda logo ordem ás bochechas, que ao saber da boa notícia se contraem de emoção e em uma agitação tremenda logo fazem questão de deixar escapar os dentes.
Quando a menina sorri, mal sabe ele que é o culpado. E mal sabe que os dentes são os chefões daquela mensagem, que logo logo enviarão o alvará para todos os pêlos do braço levantarem em sinal de rendição.

12 de outubro de 2009

aonde, um dia


“O senhor tem recordação daqueles dias de chuva ininterrupta em Satolep, daquele cinza metálico que se deita sobre tudo e todos? Pois foi num desses períodos, em estado de completo desconforto com o mundo, que comecei a avistar o lugar aonde um dia quisera chegar.” Deu-me um cigarro e pôs outro na boca. Acendeu-os. “E então?”, perguntou-me, depois da minha primeira tragada. “Sinto-me melhor em tudo”. Respondi.

trecho de Satolep, Vitor Ramil

5 de outubro de 2009

Descansa


Hoje vi Satolep anoitecer as duas da tarde. Cada perambulante guardava sua agonia esondida que quase aflorava com a água daquela chuva. As luzes da praça se acenderam, os passarinhos voltaram todos para seus ninhos, os carros corriam descompassados.

Ninguém sabia ao certo como agir naquela situação, naquele entardecer que chegou sem avisar. Os boêmios comemoraram, as meninas sentiram medo e apertaram as mãos de seus namorados, as árvores teimavam em levantar vôo. Satolep. Satolep merecia um descanso. Dorme cidadezinha, o sol já vem cuidar de ti.