8 de dezembro de 2012

modernidades


5 horas da manhã. Eu tava esperando um táxi e um cara que eu não conhecia se aproximou perguntando se eu tava triste. "Olha, na verdade eu não sei te responder". Ele disse que tava. Ele se apaixonou por uma mulher e ontem, na festa, descobriu que ela era prostituta. Pra piorar, ela também não quis ficar com ele. Ele chorou na minha frente, na rua, esperando um taxi. E eu, logicamente, chorei com ele, porque eu sou do tipo que chora. "Vai dar tudo bem certo, amores serão sempre amáveis" (e todos os meus mantras e todos os mantras que pudessem confortar).

Encontrei meus amigos de novo, desisti do táxi, disse pra todo mundo que o amor é a coisa mais linda do mundo porque a gente chora a dor de um estranho na calçada de uma festa. Eu não sei se o fato de ter ouvido os problemas do cara ajudaram em alguma coisa e mudaram o rumo da vida dele (vida: esse enorme pote de sorvete cheio de feijão), mas eu passei a ter mais fé no mundo. O Odair José teria ajudado mais. Talvez. Em pleno 2012 encontrei uma pessoa que encontrou um estranho e contou uma dor de amor pra ele. Em época de amor líquido, época de fingir que não se conhece, época de falar pouco (porque falar muito espanta, responder na hora dá bandeira, ser legal configura relacionamento e veja o livro das regras no anexo, att) um estranho me contou uma dor de amor.

Não sei onde me encaixo nessa nova onda de relacionamentos interpessoais aflitos. Não sei se eu sei e nem se eu consigo ser moderninha líquida, mesmo sabendo que o Tio Bauman esperaria isso de mim. E, não por precisar de qualquer tipo de envolvimento mais duradouro/estável ("na modernidade a duração era princípio de ação") porque nunca tive essa “bolação” de tempo e segurança (quando fui um casal nunca comemoramos datas porque não sabíamos nenhuma delas e nunca ligamos muito se fazia um ano ou dezoito que estávamos juntos). Acho que decepciono Tio Bauman porque gosto de poder falar e tenho total propensão a gostar de jogar conversa fora por aí, conhecer quem não conheço e principalmente por não ter nenhuma espécie de escudo protetor que me faça querer afastar as pessoas. Nisso, uma grande queda por homens que não gostam de mulheres que se fazem de difícil (eu nunca entendi qual é a moral de se esforçar pra mostrar indiferença a alguém que se dá bola).

8 horas da noite de um dia cheio de ressaca sendo curada em Satolep. Amor espalhado pela casa, nos petiscos da mãe, no churrasco que o pai começou a preparar, nos gritos dos irmãos, na voz do sobrinho falando “tia, tia, tia”, muitas histórias sendo contadas. Minha mãe perguntou se eu tava feliz. Agora sim, muito. 

5 de dezembro de 2012

deslumbre


Quando já tava nessa cidade há uns seis meses pensei que quando completasse um ano da minha chegada aqui escreveria uma carta endereçada a mim contando como foi. E uma aos amigos que fiz aqui, agradecendo e convidando pra mais alguns desses de histórias pra contar. Aos dez anos aqui ou em qualquer outra cidade que me acolhesse eu leria a carta e lembraria como foi aquele primeiro ano em Porto Alegre. Turbulento. Incansável. De muitas noites sem dormir. Ainda não é dia o dia escolhido pra escrever a carta, mas é final de ano e, se a publicidade agir em mim como deveria, é época de emoções à flor da pele. Por sinal, a frase à flor da pele me lembra que quando era criança ganhei uma “agenda da tribo” em que dezembro vinha com a música do Zeca Baleiro. “Ando tão à flor da pele que qualquer beijo de novela me faz chorar”. Feliz, ando à flor da pele feliz. Dezembro é meio beijo de novela. Meio propaganda do Zaffari. Onze meses de Porto Alegre.

Eu sempre soube que iria morar aqui. Nunca soube como seria. Perdi muito ao vir e ganhei muito chegando. Uma balança que nunca despencou muito pra um lado ou pra outro. Deixei uma vida de dois, virei um, aprendi em alguns momentos a ser dois de novo, desaprendi. (No livro que eu ando lendo “O que é o Amor” a autora diz que os amantes são sempre ignorantes). Aprendi aqui, sentada vez ou outra no Cantante, a costurar o meu coração só pra poder rasgar de novo. Porque viver é andar por aí rasgando o coração. Ninguém deixa de fazê-lo porque aprendeu a ser mais forte ou mais sábio. E, também não quero, nunca, esse tipo de sabedoria. Aprendi, tomando um “Carioquinha”, a administrar a balança (infelizmente não a do meu peso). Felicidade, dinheiro, gastrite, amor. E, por aí vai.

Dei jeito no que tinha que dar. Troquei lâmpadas. Gritei de câimbra na panturrilha (herança genética que me atordoa e que me traz sentimento de casa) sem meu pai por perto pra trazer Gelol na madrugada. Fui, na maioria do tempo, radiante. Emocionada. Deslumbrada. E o Aurélio diria “que se entusiasma facilmente por algo”. O melhor sentido da palavra deslumbrada. Uma ótima palavra que perdeu o valor nas bocas por aí. Uma ótima definição pra esse tempo aqui.

É terça. E adoro terças. Me vi de frente. Sem fantasia. Me olhando no espelho e pensando: eu passei por isso. Eu consegui me virar. Onze meses conseguindo me virar. Sem deixar nenhum aluguelzinho sem pagar, passando uma semana com apenas alguns trocados na carteira, descobrindo novos lugares que são meus, comprando uma pilha de livros que não tenho tempo pra ler, cultivando amigos e fazendo jantares pra comemorar que eles existem e que sempre se arranja tempo pra eles.
Eu que sempre fui meio descrente de mim consegui onze meses. Sem contar. Acordando e perguntando: hoje é dezembro? Hoje é. Que tempão que passou. E, como passou rápido. E, ainda tem um mês pro dia da derradeira comemoração que certamente vai passar voando e vamos todos gargalhar lembrando daqui a muito tempo. “Vamos celebrar nossa própria maneira de ser”. Desorganizada, quase sempre meio de chegada, quase sempre meio feliz até triste, deslumbrada.

Feliz onze meses, Porto Alegre. 

3 de dezembro de 2012

sei



Não sei se foi a passagem de Mercúrio, não sei se é a chegada do fim do ano, não sei se é felicidade de Natal (porque decidi gostar de Natal, eu e ele acertamos os pontos e resolvemos nos amar), mas eu tô uma mulherzinha. Ontem me peguei no telefone falando um "que amor" mais longo que de costume. Tenho ligado mais para as amigas. Tenho feito mais comentários sobre voltar pra academia. Tenho cogitado comprar uma máquina de costura. Tô querendo pintar a casa, tô pensando em quadros novos pra ela, tô pensando em desenhar em um canto da parede. Chorei vendo um vídeo de casamento que me mandaram. Chorei vendo um vídeo de criança. Só de mulherzice. Uma mulherzice aguda e feliz de fim de ano. Do tipo que fortemente se impressiona com um jantar a luz de velas no restaurante mais bonitinho dessa cidade, com abrir a porta do carro, com locadora e com Smiths. Mulherzices boas que geraram comentários. "Tá felizinha, é?". "Tô, Mercúrio se foi, né?". "Aham, sei".